Semana passada, na padaria, ouvi a moça do balcão me perguntar
- Moça, esse seu cabelo, é natural?
E também pude ver a surpresa e admiração dela quando respondi
- Sim, ele é.
É comum ouvir de algumas pessoas frases como "você deveria ser modelo", "nossa, esse seu corpo é de dar inveja", "seus cachos são lindos", etc, mas nem sempre foi assim e nem sempre eu me senti bem, independente dos elogios dirigidos a mim.
Fui estudar muito cedo quando criança, por consequência era sempre a mais nova da turma (e foi assim até a conclusão do ensino médio). Ouvia alguns comentários sobre o quanto eu era inteligente (papo de adulto), ou como meus pais se orgulhavam de mim por eu gostar de estudar. Eram bons, confesso, mas mesmo assim não era tudo o que eu queria. Eu queria ser bonita.
Ah, sim... Me sentia feia demais! Todas as priminhas com aquele cabelo liso, lindo de dar inveja e eu nasci como? Com o cabelo crespo! Nem liso, nem cacheado, nem ondulado, nem nada do que eu aceitava como bonito. Era crespo, herança predominante da família Nunes, além do sangue que também corre em minhas veias. Os comentários sobre cabelo ruim me atingiam de uma maneira péssima. Uma criança com a auto-estima baixa. Essa era eu. Minha mãe nunca me incentivou a usar alguma química de transformação, sempre arrumava os cachinhos (que fazia com o pente) no meu cabelo, mas eu cresci (pra caramba, por sinal) e aquelas coisas infantis não combinavam mais comigo. Uma tia, então, me ofereceu o tão sonhado alisamento. Eu tinha 12 anos.
Nossa, que liberdade! Meu cabelo extremamente volumoso tinha se transformado em algo domável. Enquanto molhado eu podia desfilar com ele solto, mas quando secava, voltava a vida de rabo de cavalo e bem... As piadas não eram agradáveis.
Além do cabelo, que alisei por quase 3 anos, tinha outro fator que fazia com que eu quase me detestasse: eu sou muito alta e magra (atualmente, 1,79m, 52kg). Eu podia ser a mais nova, ouvir pessoas me falando que eu era inteligente por estar naquela turma, mas as palavrinhas "gigante", "girafa", "poste" ecoavam mais na minha mente do que quaisquer elogios. Eu olhava para mim e não conseguia encontrar a quem culpar por eu não me gostar.
Foram anos assim. Até que um dia eu respondi a uma piadinha e me senti free. Foi algo mais ou menos assim:
- Aff, que menina magra, só tem ossos!
- Aff, que inveja brava, louca pra comer de tudo e viver no meu corpinho.
Não foi pensado, juro! Apenas tinha ouvido de alguém o quanto gostaria de poder comer tudo (sou comilona) e continuar com esse corpo de modelo (não acho, sou meio troncha, mas a balança na farmácia não sofre muitas alterações comigo), depois ouvi essa piadinha infame sobre meus ossinhos e respondi. À altura e nas alturas, porque a pessoa era mais baixa que eu.
Até ai tudo bem, foi a hora em que eu comecei a aceitar algo que eu achava ser um defeito. Gosto de ser magra. Ponto pra Grifinória!
As coisas mais difíceis ficaram pra depois, claro. Superar minha altura e o meu cabelo seriam difíceis, mas não foram coisas impossíveis. A história segue nas próximas linhas (adoro falar isso kkk)
Pois bem, vamos falar de altura. A girafa aqui sempre recebeu muitos apelidos relacionados a estatura. E eu os odiava. Odiava entrar numa loja, procurar uma calça comprida e ela ficar coronha (curta) em mim. Vestidos longos? Nem em sonho! Era quase um trauma (que drama! kkk). Mas então, num belo dia, resolvi olhar pra mim e dizer
- Querida, prestenção! Vai fazer cirurgia de redução de perna? Vai ficar menos alta se reclamar? Ame-se!
Sim, foi bem assim, com essa delicadeza digna de um coice de mula, que eu passei a olhar pra mim e dizer: eu não preciso de salto 15 (odeio salto)! Nesse dia eu comprei a calça que era coronha mesmo, usei e amei! Nesse dia eu ouvi meus amigos me chamando de girafa e não me senti mal, na verdade é o apelido carinhoso, depois de vaca, que eu mais gosto. *-*
Posso não passar desapercebida num lugar, posso nem sempre encontrar uma calça realmente comprida ou uma saia realmente longa (isso é tão verdade que eu só tenho duas peças, de cada, no guarda-roupas). Mas eu gosto de ser alta. Dois pontos para Grifinória!
O cabelo foi o mais difícil de aceitar. Como disse, foram quase 3 anos alisando, escovando e por ai vai. Com o passar do tempo perdi os meus cachinhos, minha identidade... Aquela raiz crescia alta (eu chamava de tufinho) e eu corria para o salão. Olho pra trás e penso que se eu tivesse juntado a grana que eu gastei em salões numa poupança eu tava ryka!
Lembro da última vez que usei o cabelo liso, na minha festa de 15 anos que foi realizada em abril de 2005 (quase 10 anos atrás, agora entro numa crise de quase 30 e choro! #cry). A moça que cuidou do menu cabelo não podia fazer milagres, aquela murrinha estava lisa! Ou, melhor dizendo, aLISAda! Foi feita uma escova, chapinha, ficou bonito, e na hora da festa, com aquele vestido princesa (a cara do bolo!) eu pensava que derreteria. A cabeça suava e a chapinha me dava adeus. Pense numa tristeza! Desde então, não fui em salão fazer escova e chapinha. Era um rabo de cavalo com uma trança. Era feio, muito feio. Mesmo assim, eu não imaginava que poderia ter meu cabelo de volta, e mesmo se tivesse, não sabia como cuidar (além de colocar uma tonelada de cremes).
Uma amiga (grande amiga, sou grata até hoje!!) me incentivou a ter os cachinhos de volta. Me ajudava com dicas e cuidados e foi então crescendo a vontade de ser novamente cacheada. Eu não sabia como agir, então fiz uma permanente. os cachinhos não eram os meus, mas eram cachinhos e isso que importava! Então a raiz crescia, e era a minha raiz, o meu cabelo! Mas, ainda assim, não era fácil de aceitar. Os cachinhos da permanente eram comportados, o tufinho não, ele crescia e inchava, dava pra ver a diferença. Eu ia lá e permanente nele! Foi assim por um tempinho, pensei que não largaria a química tão cedo (a de cabelo, porque a da escola eu larguei assim que pude '-'). Chegou uma "época de retoque" em que eu não tinha dinheiro. O tufinho cresceu, incomodou, mas eu não podia fazer nada, né? E não é que o lindinho foi crescendo e crescendo? Ficou maior que o cabelo que ainda tinha química (desde 2005 uso o cabelo curto). Ele era tão bonito, tão cacheado, tão maleável, tão natural, tão meu...
Sem saber, entrei em transição! Fui no salão apenas cortar o meu cabelo, tirar aquelas partes com química. Cheguei em casa com um cabelo verdadeiramente meu, como antes dos 12 anos, só que dessa vez ele era amado. Hoje, após quase 10 anos da minha última chapinha, 3 anos após minha ultima química de transformação eu olho pra meu cabelo e pros tantos cremes que faço questão de ter (só bom e barato :p) e digo que sim, hoje eu gosto do meu cabelo. Pela dificuldade: Cem pontos para Grifinória! õ/
Esse é um pedaço da minha história. Eu me aceito, me amo, me cuido. Ainda ouço piadinhas (e ouvirei sempre, o mundo ainda é cheio de "sem noção"), mas não ligo. Eu sou natural. Sou alta, magra, meu cabelo é crespo e é lindo (tipo 4A). Para quem tem dificuldade em aceitar uma parte de si: você é lindo(a), perfeito(a) aos olhos de Deus! As diferenças são necessárias, as cores, as texturas, os quilinhos a mais ou a menos na balança. Tudo, tudo, tudo, faz de você ser diferente e único! Ame-se!
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